A corça branca é um animal fabuloso presente em numerosos contos e lendas
antigas. Dependendo da época e do local das lendas, a história sofre variantes:
em alguns lugares é descrita como um animal fantástico que surge do além para
enganar os caçadores. Em outras, a corça pode se transformar numa linda mulher
- em pleno dia ou durante a noite, seguidas de uma maldição. Uma variante também
mostra a corça como baba de bebes ou então na espera do amor verdadeiro de um
cavaleiro para que o feitiço seja quebrado.
Na mitologia celta a corça é um símbolo de fertilidade da natureza selvagem.
Em geral os animais brancos são criaturas mágicas do outro mundo e são ligados
às fadas, que por sua vez são vagas lembranças das deusas-mães da era
matriarcal. Nessa época, o casamento e o reconhecimento da paternidade não existiam;
o amor, a sexualidade e as mulheres eram livres – uma sociedade sem pai nem
marido onde o tio materno educava os sobrinhos no lugar do « pai ».
Considerada como animal totêmico também representa a linhagem sagrada das
mães e pode ser encontrada em lendas famosas como « o conto das crianças
cisnes » de Jehan de La Haute-Selve, A corça e a Pantera, Isomberte,
Angleburg e na trova O lamento de Margarida [La conplainte de Marguerite].
Nesta canção, Renaud – o irmão – mata a corça branca [animal totem de sua família
materna]. Esta corça, símbolo da mulher selvagem e não submissa, que brinca
livremente no interior da floresta noturna, é sua própria irmã Margarida,
aquela que passaria sua linhagem [sobrinhos] e a qual deveria proteger.
Analisada, esta canção passou a representar o fim do matriarcado na época
antiga, pois o homem – antes em papel secundário – mata seu próprio sangue e
assume o poder, como também pode ser visto em outros mitos antigos com Horácio –
que mata sua irmã Camille e Orestes – que mata sua mãe Clytemnestre.
Na nova ordem patriarcal, o pai ou irmão deve
vigiar a virtude da mulher, nascendo assim o culto à virgindade [garantia de
reconhecimento da paternidade], sobre o risco de assassinato [crimes de honra]
para proteger a reputação da família [linhagem patriarcal].
Fonte: Matricien.org


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