segunda-feira, 28 de maio de 2012

Os Gansos Sagrados



Desde um momento que Brennus não tira os olhos da linha dentada de Apennin que barra o horizonte. Atrás dele, trezentos mil homens de seu exército lhe observam sem falar nada. Ele não prometeu a glória aos que aceitassem segui-lo para o outro lado dessas montanhas ? O solisticio de verão se aproxima e a lua vai logo atingir sua amplitude máxima. Os druidas julgam que o momento é enfim favorável. O exército pode se tranquilizar. Os romanos esperam nas bordas de Allia, um modesto afluente do Tibre, bem decididos de pararem essas « hordas bárbaras », mas, desde que eles escutam os clamores de seus adversários crescerem, eles fogem quase sem combater : mais uma vez o poder « mágico » da palavra se fez.

Só resta a Brennus caminhar para Roma. E qual não é sua surpresa quando ele descobre que os portões da cidade estão abertos. No interior nada se mexe. Temendo uma armadilha, o gaulês hesita antes de penetrar na cidade e é com a maior das prudências que ele se aventura pelas ruas misteriosamente desertas. Sua surpresa é ainda maior quando ele descobre, sentado sobre curules*, veneráveis anciões totalmente imóveis. 

Impressionados, o exercito os olham com certo respeito, não sabendo se são homens de carne e osso ou estátuas. Um soldado, mais audacioso que os outros, puxa ligeiramente a longa barba branca de um desses estranhos espectros. Imediatamente, o velho bate um violento golpe com seu bastão de marfim na cabeça do insolente. Esse gesto do ancião desencadeia a raiva dos gauleses que massacram alguns romanos que se achavam no local e pilham casas e templos. No entanto, uma parte da vila escapa de Brennus. A colina do capitólio, poderosamente fortificada, serve de trincheira a uma punhada de defensores decididos a lutarem até o fim. 

O tempo passa. Uma noite, os gauleses, aproveitando a escuridão, tentam escalar, no mais profundo silêncio, a subida íngreme da colina. Tudo se passa bem. Nem os sentinelas, nem os cães de guarda percebem o perigo. É então que os gansos sagrados de Juno, deusa protetora de Roma, começam a gritar e a bater as asas, correndo em todos os sensos, perturbados. O romano Manlius, o primeiro, dá o alerta. Com seu escudo, ele faz cair no vazio um gaulês que estava quase chegando ao baluarte. Com sua queda, ele leva aqueles que o seguia. 

O ataque ao capitólio fracassou...por conta dos gansos sagrados! No entanto, os sitiados sofrem cada vez mais de fome e devem renunciar e fazer um trato com os gauleses. O tribuna Sulpicius vai ao encontro de Brennus que exige um resgate; os romanos têm que aceitar as condições dos vencedores.

Quando juntaram o enorme tesouro, os romanos levam ao chefe gaulês que faz proceder a uma longa e minuciosa pesagem. Sulpicius, percebendo que os pesos utilizados eram falsos, se queixa à Brennus. Esse ultimo, que sabia bem, lança sua espada sobre a balança gritando com arrogância: “Infelicidade aos vencidos”! 

Os romanos guardarão sempre uma terrível lembrança dessas hordas gaulesas vindas para pilhar suas cidades.

·   *Um tipo de assento feito de marfim cujos magistrados romanos costumavam se sentar.

Les Légendes du Monde - traduzido do original em francês por Elantia Leto


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